Monday, January 12, 2015

Arte Fofa versus Arte Séria

Para falar a verdade tenho sido um "artista sério", eu sou um chato :) eu me preocupo com a carreira, preciso expor regularmente a todo custo, sou como um curador conservador, sigo a trilha do mercado. Sou especialista nos lobbies das artes, em dar tapinhas nas costas. Eu quero viver da minha arte, a competição entre os artistas é selvagem, eu concorro sim com todos eles (assim como eles concorrem comigo), eu não divulgo editais (nem para meus amigos mais queridos, porque não quero competição)(mesmos que eu não escreva editais), em resumo, quero que os outros artistas de lixem.

A menos é claro quando vou dar aulas de pintura para amadores, neste caso eu me converto no artista fofo. Sou super compreensivo, valorizo o processo, o resultado não é importante, a comunhão dos pintores na aula é uma coisa linda, todos alí desanuviando seus problemas pessoais e acreditando que estão fazendo arte. Parece terapia ocupacional, mas não posso dizer isto. De vez em quando solto uma perolinha profissionalizante, para dar um susto nos alunos "é preciso ter ambição".

Ja dei aulas como "artista sério"... acho que este viés não é muito sedutor, não agrega muitos alunos. Eu falava coisas como "só é artista quem faz exposição", "não existe arte sem exposição". E isto assusta as pessoas. Eu dizia coisas como "o fazer artístico exige responsabilidades e compromissos, que só podem ser apreciados numa exposição pública", "considero que o início da minha carreira foi com minha primeira exposição". Eu coloco um peso enorme nas costas dos alunos. Onde aprendi isso? Na Faculdade de Artes Plásticas da FAAP, onde estudei. Os professores não tinham dó... fomos treinados para a guerra, para o corpo a corpo da trincheira. Tínhamos de saber argumentar e defender nossos trabalhos de perguntas duras todos os dias: "Qual o conceito do seu trabalho???" com o professor fazendo aquele sorrisinho de Conde Drácula. Não apenas as aulas de ateliers eram duras, mas as aulas teóricas também. Na faculdade de arte aprendemos a separar o suposto joio do trigo, e a condenar: "Isto não é arte".  Foi uma boa escola, séria.

Existe um tipo cruel de artista sério: o artista sério-jovem, são os mais agressivos, não vacile perto deles, você vai ficar para trás. Com eles não tem lero-lero, assim como não existe conversa mole com galeristas ou curadores. No mundo da arte contemporânea você tem duas opções, é "oi" ou "tchau".

A boa notícia é que a idade amolece os corações, vamos ficando mais sábios, tolerantes e menos defensivos. Hoje estou indo para o lado fofo das artes. Por que? Porque ja sou calejado, e não preciso entrar na categoria jovem. No mundo duro das artes, somente arte é arte. No mundo fofo tudo é arte. Concordo que num primeiro momento é importante considerar que somente arte é arte, é um exercício de vocabulário e jargão profissional, as pessoas precisam compreender a importância dos museus, precisam valorizar o trabalho dos artistas, precisam investir em arte, por isso que se entende (num primeiro momento) que artesanato não é arte, culinária não é arte, arquitetura não é arte. Num segundo momento, num plano mais amplo e culto podemos aceitar que tudo seja arte, então tudo aquilo e muito mais pode ser considerado arte. Em resumo, podemos aceitar que tudo seja arte, aceitamos a arte fofa, desde que não queiram ferrar com a arte. Ops.... cade o fofo? É preciso disciplina na fofura.

Ricardo Ramalho, Janeiro, 2015


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