Tuesday, July 29, 2014

O artista que não vende nada e acha que vale muito

Isto acontece com alguma frequência, certos artistas cobram caro pelos seus trabalhos, sem que seus valores tenham respaldo do mercado, ou seja, seus preços não são consagrados por um volume de vendas significativo. Como defendem seus preços então? Alegando "maturidade artística", "currículo", "anos de janela", ou então "obra trabalhosa".

Nenhum destes argumentos são válidos para justificar um preço. Maturidade é o mínimo que se espera de um trabalho para despertar interesse. Currículo não garante cotação, Nelson Leirner é um exemplo disto, o arrojo de um artista pode gerar interesse curatorial, mas não repercutir da mesma forma no mercado. Anos de janela é até engraçado, o artista pensa que por trabalhar há 30 anos merece ser valorizado... se ele carrega os mesmos vícios e limitações a vida inteira certamente não colherá os frutos que pretende. Obra trabalhosa é outro equívoco comum, como se uma obra simples pudesse ser mais barata, e a trabalhosa mais cara, sendo que a apreciação de uma peça reside na sua genialidade e não na sua complexidade.

O que justifica um preço são as vendas e a demanda. Se uma obra vende muito, se todos querem ter uma em casa, se ele vende tudo o que faz, então ele vai gradualmente subindo seu preço, ao longo de muitos anos. Com cuidado, porque uma subida prematura pode interromper um ciclo virtuoso de vendas e distribuição. 

Há quem diga que uma pintura cara vende mais, porque indicaria que a obra é relevante. Eu não compro este argumento... a menos que o artista ja seja muito consagrado pelo mercado, e seus preços estejam bem fundamentados. Forçar um valor pode ser desastroso, pega mal depois diminuir, os colecionadores querem valorização e não desvalorização.

Os artistas não devem se apegar aos seus trabalhos, devem facilitar a venda, esvaziar seus ateliers, e produzir sempre novas obras. É triste acumular trabalhos encalhados no atelier, ao invés de faturarem 20 mil vendendo 10 pinturas, preferem micar com uma produção achando que vale 10 mil cada, e acabam por não vender nenhuma... e ainda se revoltam com o sistema de arte. Vivemos numa economia de mercado, não existe valorização porque o artista é gente fina. O artista que quiser prosperar, e fazer seus colecionadores felizes com a valorização, precisa ter seus preços bem fundamentados ao longo do tempo.

Ricardo Ramalho

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